Roberto Smith é destaque do Futura Trends 2012

7 de maio de 2012 - 19:07

Com o tema “Desafios e oportunidades para o sucesso em gestão dos negócios e das pessoas”, o Grupo O Povo de Comunicação promoveu hoje (07) a segunda edição do Seminário Futura Trends. Voltado sobretudo para empresários e gestores de médias e grandes empresas, o evento contou com a participação do presidente da Agência de Desenvolvimento do Ceará (Adece), o professor doutor Roberto Smith.

Juntamente com a também professora Tânia Bacelar, Smith foi debatedor do painel “Cenários e Desafios do Brasil até 2020”, apresentado pelo professor PhD James Wright, da Universidade de São Paulo e coordenador do Programa de Estudos do Futuro da Fundação Instituto de Administração (FIA). Confira abaixo, na íntegra, as ideias do presidente da Adece sobre o tema, que foram expostas esta manhã:

Tendências para o futuro: Brasil 2020

Roberto Smith – comentários à apresentação do prof. James Wright

 

  1. Projetar os próximos oito anos não implica em longo prazo. Corresponde a um período inserido em prováveis dois mandatos presidenciais quando essa é a vontade dos eleitores, condicionada às promessas e realizações de Governo.


  2. Trata-se, pois, de um período inserido dentro de um Plano de Governo. Parece claro que necessitamos mais. Necessitamos, pois de um Projeto de Nação com base em pressupostos referenciais.


  3. Analisando um pouco para trás, a estabilização econômica, o respeito aos contratos, o rompimento com alguns preceitos conservadores do neoliberalismo e com os princípios de subordinação em matéria de política externa, nos anos recentes permitiram que o Brasil adquirisse destaque no panorama internacional, sobretudo no pós-crise de 2008.


  4. Em paralelo a isto, o compromisso popular conduziu a economia a voltar-se para agilizar o mercado interno do País, fato inusitado em nossa história.

  5. Toda política econômica foi feita às avessas”. Essa era a ótica da mídia nacional. Isso é sabido.


  6. Quando se procura enxergar tendências em direção ao futuro da nação, é preciso ter em consideração certos elementos do passado, da nossa história, de nossa formação social e cultural. Isso implica em trabalhar melhor, e esse deve ser um exercício coletivo, com alguns fatores de ordem cultural que impregnam o nosso constructo social ao longo da história. Podem tanto ser portadores de certas rigidezes a mudanças quanto certas formas de criatividade e respostas a desafios. Por isso não podem ser envolvidas e contingenciadas a juízos de valor, que constituem muitas vezes puro preconceito centrado em nossa bagagem de propaladas heranças malditas de um passado ibérico, absolutista, escravagista e colonizado. Mazelas, o mundo que fez a suas revoluções burguesas também as tem.

  7. A nossa matriz de formação econômica capitalista seguiu um rumo distinto do mundo liberal, onde a presença do Estado sempre foi significativa no ordenamento econômico e social. Nem por isso pode ser alijada do mundo da racionalidade com que a ideologia dominante pretende ser portadora das verdades que emanam do mercado. A crise que está aí corrobora com essa desmistificação.


  8. Isso implicou, é verdade, num lento amadurecimento das forças democráticas e de representação, numa grande assimetria de poder entre as chamadas elites – os donos do poder de Faoro – e as classes populares, também denominadas classes subalternas. Em termos regionalistas, sabemos que quanto maior foi a assimetria de poder, menor foi o surgimento de um mercado interno. Lembrem-se daquele bolo que nunca foi dividido. O Nordeste do País é o melhor exemplo, como a disparidade regional é fruto de um constructo político e econômico, com pouca margem de explicação em fatores de ordem natural e climática.

  9. É possível entender que presentemente no País existem programas que podem ser analisados sob algumas formas de percepção que evidenciam uma clivagem, na esfera do pacto federativo, da guerra fiscal, da política regional etc.


  10. Procuro, no entanto, chamar a atenção que no País existe uma clivagem específica, que antes da queda do muro costumava-se chamar de luta de classes. Hoje se chame a isso como quiser, mas é preciso entender que essa clivagem contempla distintos programas, é verdade, nem sempre explícitos face a ausência de conteúdo da maior parte dos partidos políticos e suas práticas.


  11. Esses programas distintos trazem embutidos distintas culturas políticas, distintos arsenais de política econômica e social e respectivas bases teóricas, e distintas visões em relação a tamanho do Estado e dos impostos, abrangência das instituições envolvendo o público e o privado e suas esferas de regulação, formas de entendimento e atuação sobre o meio ambiente, admissibilidade de um estado laico no contexto da modernidade, condução de política externa independente e soberana, políticas que admitem visões distintas do mundo do trabalho, inclusive trabalho infantil, da cultura, de gênero, indígena, mulheres, quotas raciais, justiça, segurança, acesso aos serviços públicos, e… ao consumo.


  12. Algumas das mudanças que vem ocorrendo no País no pós-ditadura tem decorrido de uma reviravolta nesses processos que contemplam distintas concepções de sociedade e a conquista de espaços políticos para essas novas agendas frente ao tradicionalismo das elites.


  13. O tradicionalismo que sempre enfrentou a crise econômica com a mesma fórmula: o setor financeiro despregado do setor produtivo projeta a crise, que esconde os seus ganhos, o Estado que paga a conta e se endivida e faz o saneamento do setor público à custa de desemprego e supressão dos direitos do cidadão, dos trabalhadores. Em defesa desses princípios é que na crise enfatizaram a “gastança” do Lula. Não vamos nos esquecer. A história testemunha muitos retrocessos.


  14. Como corolário de um Estado forte, tivemos a formação de uma classe empresarial débil, não homogênea, de natureza rentista, e dependente do Estado, com diferenças setoriais é verdade. Sobretudo, até recentemente, uma classe sem projetos, e sem força aglutinadora.


  15. O que se assiste, de forma gradual, é a um relativo fortalecimento da classe empresarial, com distintas inserções, com um papel mais bem direcionado pelas suas entidades representativas, mas ainda muito dependentes do Estado, muito longe de atingir maior autonomia e defesa de um projeto nacional.

  16. O alargamento do mercado interno faz avançar as oportunidades para setores produtivos dentro de novos espaços territoriais e adensamento de cadeias produtivas. Contudo, frise-se, isso se ocorre de forma responsiva às mudanças políticas e econômicas imprimidas ao País. As classes dirigentes empresariais não tem sido protagonistas das mudanças que tem permitido novos nichos de negócios, e ampliação de demandas internas, apesar do esforços recentes da CIN e outros organismos de classe como a ABIMAQ por exemplo.


  17. Contudo, a nova ordem econômica internacional coloca o País em face de um relativo despreparo no sentido de fazer valer as suas prerrogativas. Amplos setores produtivos nacionais passam a serem montadores e etiquetadores de produtos chineses.


  18. É preciso encarar a realidade sob duas óticas complementares: por um lado, somos portadores de irracionalidades em nossos processos institucionais (entenda-se governamentais) e concorrenciais, refletidos sobre a nossa estrutura de preços. Se fizermos um balanço entre incentivos e desincentivos à produção a conta pende para o último. Corroboram com isso, por exemplo, as debilidades logísticas, que estão sendo enfrentadas, os elevados custos de energia, os poderes monopolistas como na área de comunicações; os recheios rentistas e de reservas de mercado, os elevados custos cartoriais, só para mencionar alguns. Tudo isto que é apelidado de “custo Brasil” tem endereço certo, para não se referenciar apenas em cambio e juros, e pode ser enfrentado com base em agendas direcionadas.


  19. Por outro lado, os apelos à inovação, e ao aumento de produtividade para a competitividade se ressentem de uma estratégia nacional, que embase uma política produtiva coerente e não apenas de cunho defensivo. Uma política ativa que aponte escolhas setoriais, que elimine gargalos, que oriente processos de pesquisa e formação de recursos humanos com cronogramas e recursos direcionados. Uma política que garanta a confiabilidade de cada grupamento de agentes econômicos para direcionamento dos investimentos e expectativa de retornos.


  20. A China tem avançado envolvendo planejamento rígido estatal mesclado com iniciativa empresarial, com decisões que envolvem centralismo e condições rebaixadas de sua força de trabalho empregada. Equalizações decorrentes de câmbio irrealista, e diferencial de salários deveriam ser considerados em relação às importações. Não chamaríamos a isso de protecionismo.


  21. Por outro lado, as conquistas em marcha em relação ao mercado interno devem avançar, com esforço em regulação. A ótica individualista que tem presidido o consumo e, portanto, o direcionamento dos investimentos tem ocorrido em detrimento das soluções voltadas para o consumo coletivo e que afetam significativamente o meio urbano num País que apresenta elevada taxa de urbanização.


  22. Muitos dos ensinamentos e práticas nesse sentido foram esquecidos ao longo do tempo. A crise do urbano já foi anunciada faz tempo e tem que ser encarada juntamente com os territórios rurais. Não é uma questão municipal apenas, e nem pode estar adstrita a um plano de governo, tal a sua proporção e prazos resolutivos.


  23. Desde a década de 80 do século passado o País passa pelo processo de transição demográfica. Tem implicado numa queda tendencial da taxa de crescimento vegetativo, decorrente de uma diminuição das taxas de mortalidade (o que no caso brasileiro, ocorreu, sobretudo no período entre 1940 e 1960, com a melhoria das condições de saneamento e descoberta da penicilina) e de natalidade (sobretudo a partir da década de 1980, como resultado da disseminação do uso de anticonceptivos e planejamento familiar. Tal processo passa a ser responsável por mudanças na estrutura da distribuição etária da população residente, com declínio na proporção da população mais jovem, no conjunto da população, e expansão gradual na proporção da população mais idosa. A transição demográfica deve ser, necessariamente, incluída nas agendas do futuro da nação, com todas as suas implicações e dinâmicas populacionais.


  24. A preocupação com o futuro faz parte da agenda de um País que se projeta internacionalmente e passa a ter voz ativa na esfera das nações. Para isso os fios condutores de um debate estratégico nacional com base em demografia, política de governo, sujeitos e protagonistas sociais culturais e econômicos dotados de projetos, aprofundamento da democracia, de responsabilidade ambiental, devem estar aptos para dar a direção de como a Nação desejada se projeta.


  25. Daí a importância e oportunidade com que se reveste esta iniciativa do jornal O Povo, avançando na esteira legada por Demócrito Dummar, a qual sou grato pelo honroso convite em participar.